Carteira de Habilitação aos 16 anos. Especialistas ouvidos pela Perkons divergem quanto à redução da maioridade, porém acreditam que educação para o trânsito é fundamental

Já não é de hoje a enorme discussão entre estudiosos de trânsito sobre a idade mínima para se dirigir no Brasil e no mundo. Os que são a favor aproveitam o argumento de que em países mais desenvolvidos como EUA e França, os jovens de 16 anos são habilitados a dirigir, já aqueles contra a mudança alegam que o Brasil não tem capacidade de educar os menores para tal responsabilidade. E, em meio à polêmica, projetos de lei tramitam pela Câmara, muitos há anos, sem gerar uma conclusão do tema; e parece que a discussão está longe de terminar.

Pelas regras atuais não restam dúvidas: entre as exigências para obter-se a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) está a imputabilidade penal, isto é, a capacidade de um indivíduo em ser punido criminalmente por seus atos. De acordo com a legislação brasileira, isso acontece a partir dos 18 anos. Nesse sentido, qualquer discussão que proponha a redução da maioridade para que jovens com 16 anos possam tirar carteira deve levar em consideração fatores que extrapolam o simples discernimento do condutor. Além disso, as opiniões a respeito do tema não são unânimes. Para o doutorando em Ciências Penais pela Universidade de Buenos Aires, Haroldo Natter, é possível reduzir a idade mínima para obtenção da habilitação sem que haja diminuição da maioridade penal. “Basta uma alteração no inciso I do artigo 140 da Lei 9.503/97. Não há relação lógica entre a exigência de imputabilidade penal e poder obter permissão para conduzir veículos ou mesmo obter a habilitação”, afirma, acrescentando que “não é a imputabilidade penal que evita que os crimes aconteçam, tampouco, que impedem o ressarcimento dos danos patrimoniais às vítimas de acidentes de trânsito ocorram”, defende.

Por outro lado, recentemente o Governo Britânico anunciou que irá promover melhorias na formação dos jovens condutores, depois de verificar que um quinto dos acidentes nas estradas em 2011, com resultado de morte ou grave lesão corporal, tiveram envolvimento de pelo menos um motorista entre 17 e 24 anos. Uma das propostas do Departamento de Transportes do Reino Unido é a de aumentar o período de aprendizagem dos jovens que buscam obter habilitação, permitindo que o aluno tenha aulas em autoestradas e um período de estágio ampliado.

Para o advogado Mestre em Direito Processual Penal pela PUC de São Paulo, Maurício Januzzi, a educação de trânsito é o que diferencia o motorista brasileiro do de outros países que possibilitam a obtenção da habilitação para dirigir a partir dos 16 anos. “Os países que adotam esta postura investiram muito na educação de trânsito e não possuem um acentuado abismo social entre as classes sociais. Nesse sentido, os jovens passam a ter responsabilidade mais cedo e, por isso, aos 16 anos já são responsáveis pelos seus atos tanto no âmbito civil como criminal”, explica. Januzzi é enfático ao defender que a experiência não poderia ser replicada no Brasil, já que considera a educação nacional muito falha. Segundo ele, a maioridade penal e a redução da idade mínima para habilitação devem caminhar juntas. “São indissociáveis uma da outra. Pois se pressupõe que para dirigir um veículo, fazer um seguro, o jovem deva ter a sua responsabilidade atrelada a isso. Assim o motorista precisa ser responsável pelos seus atos, tanto na esfera cível e criminal para que possa dirigir e ser habilitado”, complementa.

O especialista em Direito do Trânsito e comentarista do site CTB Digital, Julyver Modesto, alerta para o que chama de novos “maiores de idade” que surgiriam caso idade mínima para dirigir fosse reduzida para 16 anos, sem que houvesse uma mudança no Código de Trânsito Brasileiro. “Este novo cenário exigiria uma análise crítica sobre esta possível futura realidade, já que é notório o fato de que os acidentes de trânsito constituem uma das maiores causas de mortalidade em nosso país e que a conquista da habilitação pelos mais jovens representa, muitas vezes (e sem exageros), a concessão de uma licença para conduzir uma potencial arma”, esclarece.

Mas assim como o governo britânico, os mais otimistas acreditam que é possível uma mudança cultural e de educação para que sejam criados bons motoristas assim como bons pedestres, sendo observadas algumas condições como explica o professor Haroldo Natter: “Penso que poderiam ser adotados alguns procedimentos educativos, tais como: a) tornar obrigatório a disciplina de educação para o trânsito do ensino fundamental ao ensino superior; b) obrigatoriedade de o condutor menor de 18 e maior de 16 anos estar matriculado e frequentando estabelecimento de ensino; c) a permissão para conduzir veículos teria validade em horas pré-determinadas e só seria autorizada para a condução de veículos de no máximo mil centímetros cúbicos de cilindradas; por exemplo”.

A discussão sobre o tema ainda está distante de chegar a uma conclusão, mas há um consenso entre os especialistas: para se educar no trânsito é preciso tempo, além de um trabalho constante de conscientização que deve ser iniciado precocemente.

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